quarta-feira, 22 de julho de 2009

Recordações

Amigos leitores:

Caríssimos seguidores:


De novo “à carga”, como se dizia na vida militar e em cavalaria, a minha arma como é sabido.


Este mês é-me de recordações...

Se fosse viva, a minha mãe fazia anos.

Um senhor, que foi meu comandante no Esquadrão de Bula – Guiné - fez anos num destes dias e daí o meu telefonema do Porto para o agora Coronel na reserva Henrique de Sousa, que, graças a Deus, está de saúde lá por Lisboa.

Também num dia destes o meu filho primeiro fez anos de casado e me metamorfoseou num afectuoso sogro, julgo.

Casei também num mês de Julho ... e não foi no ano findo...

Pelos trinta e muitos anos de casado ganhei já o purgatório, estou certo. Também a minha mulher ganhou o céu pelo mesmo “pecado”, tenho a absoluta certeza.

Hoje passei os olhos pelo diário que escrevi durante a vida militar e no meu livro, que apenas aguarda edição, reli que, naquele já longínquo ano de 1973, bem perto de mim, um camarada ficou estropiado por haver uma mina anti-pessoal no caminho da sua vida.

Não resisto em colocar aqui aquele bocadinho de livro.

Ei-lo!

Bula, 10 de Julho

Reunimos com o comando. O campo de minas tinha que ser entregue limpo ao novo Batalhão que vinha. As panhards iam estar próximas dos sapadores e a segurança afastada era da conta do Batalhão.

Bula, 14 de Julho, sexta-feira

Manhã inesquecível, um sol inflamado aquecia aquele lugar tristonho com atractivos que eram os de um vulgar campo de minas e vi que o furriel sapador Santos, algarvio, de vivos olhos e doido por jogar futebol, se detinha estático e resistia num abafado silêncio, de tal modo que não se lhe ouvia nem o respirar.

Do alto da torre do carro de combate, onde me empoleirava, e o emudecimento do Santos me assustava, recomendei-lhe calma.

A p... está aqui só que a não encontro, disse.

Num misto de companheirismo senti-me abarcado com ele naquela atmosfera opressiva, naquela tensão nervosa... numa espécie de um irracional desassossego e, logo depois, ouviu-se um bruto estouro.

À nossa volta, com amargura, o ar agitou-se e o amigo tombou num uivo de dor. O sopro arrepanhou-lhe a perna direita... com que fizera tão bonitos golos (!).

Que ultraje! Vi sangue devastado. Que horror! Por onde andava Deus que O não vi naquele instante?!

Um soldado maqueiro acudiu cegamente com o garrote e só por sorte não pisou uma mina também.

O alferes, que pouco tinha andado além da borda da estrada e era já por si amarelado, ficou branco e, meio desfalecido, conseguiu ao menos sentar-se na valeta e de cabeça entre as mãos chorava desditosamente enquanto toda a terra emudeceu...

Uma avioneta veio.

Quando chegámos à pista de aviação – uma dúzia de quilómetros depois - já éramos ali esperados pelo comando. O coronel dirigiu palavras de conforto ao malogrado e da boca deste ouvi: “nada é que não esperasse. Sinto pena por mais não puder jogar futebol, mas não fique triste, meu coronel”.

Amigos:

Por agora fico por aqui e sem mais palavras.

Um abraço e até breve.

1 comentário:

  1. Leonel Olhero, recordar é viver, e viver é saber compartilhar com os amigos, meus cumprimentos ao seu espaço, que faço questâo de ser uma seguidora,
    com admiraçâo,
    Efigenia Coutinho
    Escritora

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